segunda-feira, 8 de novembro de 2010

ACABARAM AS REVOLUÇÕES (1)







A revolução é, hoje, um direito universal



















Em 25 de Outubro de 1917, deu-se, na Grande Rússia, uma tomada de poder por um Partido que se reclamava do Socialismo, no meio de uma sociedade em efervescência revolucionária, que se agudizou em Fevereiro desse mesmo ano, com o derrube do sistema imperial absolutista, personificado no czarismo.

A Rússia czarista tinha-se ingerido nos negócios políticos da Europa, com toda a arrogância imperial, entrando na I Grande Guerra, mas com a fraqueza de uma incipiente evolução económica e política, que se manifestou, de maneira eloquente, no planeamento e apoio logístico dos Exércitos e na avidez com que destroçou a vida de milhões de seres humanos.

Este facto trouxe uma crise de tal envergadura, que patrocinou uma revolta imensa de milhões de camponeses e operários, mas principalmente aqueles, que armados, aderiram, com entusiasmo, aos programas de ruptura revolucionária da ordem estabelecida.

Assim caiu o suporte político de um regime, que era a monarquia absolutista, em Fevereiro de 1917, (mas que estava já impulsionado, economicamente, pelas mãos da burguesia capitalista), no meio de uma Revolução, que naquela altura, não apresentava um programa claro de novo poder, nem se desenhava ainda, na maioria dos operários e camponeses armados, uma maturidade que se inclinasse para uma Revolução Socialista, cujas ideias germinavam, no entanto, já com intensidade, no seio do operariado das grandes cidades e estava a penetrar nas massas camponeses, que constituíam o grosso dos soldados armados na frente de combate.

Os monárquicos liberais e a nova burguesia capitalista pró-republicana em ascensão conseguiram instituir um Parlamento multipartidário e formar um governo provisório, sediado em Petrogrado, mas o poder real tornou-se bicéfalo, pois ao lado dessas instituições, surgiu uma nova forma de poder urbano sustentado em comités populares armados, que se intitularam sovietes com destaque para o de Petrogado, enquadrado por forças sociais e políticas, que se reclamavam do poder socialista.

Havia, na realidade, ainda um remanescente político memorial, entre os intelectuais e operários mais esclarecidos, do poder dos sovietes, criados em 1905, por ocasião de uma tentativa falhada de Revolução.

O incremento económico e social russo não apresentava, nesta altura, - Fevereiro/Março de 1917 -, uma perspectiva de uma Revolução Socialista, porque os operários, ainda que atingissem o número de alguns milhões, não tinham aderido, massivamente, a esse ideal.

Todavia, o governo provisório, que procurava estabelecer-se como poder, através de um acto eleitoral, pondo em marcha um processo e proposta da realização de eleições constituintes da um Parlamento – a Duma, continuou a política czarista de prosseguimento da guerra, razão primeira que motivou a queda de Nicolau II, com o completo desastre económico que mergulhara o país, desde 1914.

Pretendiam, mesmo, desarmar os soldados, operários e na sua maioria camponeses, que agora se organizavam, em torno dos Sovietes, nas principais cidades – Moscovo, Petrogrado, Odessa, entre outras, enviando-os para as frentes.

A propaganda e a organização dos partidos revolucionários, em especial os bolcheviques, com algumas reivindicações que foram bandeiras já na Revolução de Fevereiro, como o fim da guerra, um novo Exército com os oficiais eleitos democraticamente, jornada de 8 horas e a distribuição da terra na posse dos latifundiários monárquicos, fizeram com que uma massa substancial desses soldados aderisse ao poder do principal Soviete, o de Petrogrado.

De Fevereiro a Novembro, o movimento revolucionário liderado pelos sovietes, onde predominavam os socialistas revolucionários e figuras proeminentes da anterior Revolução de 1905, começou a pender para o lado dos bolcheviques.

O impasse na guerra continuava e a degradação da vida do operariado e do campesinato acelerava-se. Os donos das fábricas abandonavam as empresas, os despedimentos ultrapassavam as centenas de milhares. A fome era uma realidade.

Na madrugada de 25 de Outubro, massas populares armadas, lideradas por bolcheviques e com apoio de socialistas revolucionários e anarquistas, cercaram Petrogrado e controlaram o Palácio Táuride, onde se sediavam o governo provisório e o comité executivo do soviete da capital.

Foram presos alguns membros do governo provisório - outros fugiram -, e convocada, para a tarde desse dia, uma sessão extraordinária do Soviete. Contra a opinião da sua direcção, aquele determinou que o poder de governo ficasse todo ele no Conselho de Comissários do Povo, encimado por Vladmir Lénin.

Apesar de resistências internas, entre alguns dos partidos que estiveram no apoio à Revolução de Outubro, os bolcheviques vieram a consolidar o poder, decretando medidas de cariz abertamente socialista: controlo operário em empresas com cinco ou mais trabalhadores, nacionalização das grandes empresas, declaração dos direitos nacionais dos diferentes povos, permitindo a auto-gestão de territórios como a Finlândia, a Geórgia e a Arménia; confisco a favor do novo Estado das grandes propriedades agrícolas, nas mãos de aristocratas e da Igreja Ortodoxa Russa; separação da Igreja do Estado.

E, uma proposta imediata de paz com a Alemanha, que foi assinada em Março de 1918 – Tratado de Brest Litovski -, em que a Grande Rússia perdia a favor daquela uma grande parte do território que estivera até então sob o domínio do czar: Finlândia, Países bálticos (Estônia, Letônia e Lituânia), Polónia, Bielorússia e Ucrânia, bem como de alguns distritos turcos e georgianos antes sob seu domínio.

Depois da Comuna de Paris de 1871, e na sua esteira em reivindicações revolucionárias, proclamava-se na Europa uma Revolução Social.

Tal como a Comuna, a Revolução soviética colocou, na ordem do dia, uma realidade, que 46 anos antes, fora quase efémera: que uma revolução socialista pode materializar-se, ainda orientada por uma minoria.

Mas, ao contrário dos processos revolucionários ocorridos antes da Comuna, em que a grande massa popular não era parte activa (ou então seguia sem intervir) na substituição de um poder antigo por um novo poder, mas aceitava passivamente a orientação da minoria militante, que organizava a estrutura estatal de acordo com os seus interesses e a sua visão de sociedade, na Rússia de 1917 surgia uma nova ideia de Estado, em choque frontal com a dominação classista minoritária.

A governação começou a ser efectuada no interesse da grande maioria, que via nas reivindicações, que começavam a ser postas em prática o sentido real das suas necessidades e dos seus desejos.

Era revolução maioritária, contra a dominação feudal, primeiro, e nos meses seguintes, adquire feição anti-capitalista. Transformaram as suas reivindicações em programas revolucionários, que eram propagandeados em todas as movimentações sociais que se deram entre a derrota da Comuna e esse terramoto político que estava a transformar a Rússia ultra-conservadora.

Ora, tal situação aconteceu, precisamente, num país, que era o maior da Europa e se estendia pela imensidão da Ásia, e onde viviam cerca de metade dos habitantes do mesmo território europeu. Serviu, na realidade, de imediato e nas décadas seguintes de farol orientador para todo o Mundo.

Muitas das reivindicações do novo poder, como a jornada de oito horas, melhoria da condição feminina, salário igual para trabalho igual, entre outras, foram transformadas em bandeiras de luta por toda a parte.

Pela primeira vez, a burguesia mundial via-se confrontada com uma Revolução Social, que surgia perante o mundo, num imenso território, com reivindicações que interessavam às classes trabalhadoras de todo o Mundo.

E, pela primeira vez, também, via-se ameaçada com a perspectiva de uma avalanche revolucionária internacional.

Agiu de imediato. Uma grande coligação global dos grandes países capitalistas foi formada para apoiar as forças internas que se opunham à Revolução, instituindo a maior campanha de terror nas zonas que aquelas controlavam, ao mesmo tempo que desenvolvia uma campanha de propaganda sem precedentes, internacionalmente, contra os objectivos e as práticas que a nova governação soviética impulsionava.

Fomentou, internamente, uma guerra civil, iniciada em Abril de 1918, armando e financiando Exércitos e milícias constituídos por antigos oficiais fiéis ao czar, ao mesmo tempo que as principais potências capitalistas, já aliadas na I Grande Guerra, norte-americanas, inglesas, francesas e japonesas, desembarcaram tanto nas regiões ocidentais ( Crimeia e Geórgia), como nas orientais (ocupação de Vladivostok e da Sibéria Oriental).

Pretendiam derrubar, a todo o custo, o novo poder que se institucionalizava na Rússia.

Queriam estabelecer “um cordão sanitário” que impedisse o alastramento das ideias subjacentes ao poder socialista do “mundo ocidental”. Foi uma guerra longa – de 1918 a 1922 - ganha pelo poder soviético.

Mas, no campo da economia, esta guerra, fomentada pela burguesia coligada dos principais países desenvolvidos, teve profundas repercussões na vida quotidiana das classes laboriosas, em especial o campesinato. Começava a notar-se algum cansaço no sentimento revolucionário dos primeiros anos. Além do mais, o governo soviético teve de confiscar parte dos cereais do campo para sustentar o esforço de guerra no geral, e, em particular o abastecimento das cidades.

Os dirigentes do Partido Bolchevique (que entretanto se veio a chamar Partido Comunista) e do novo Estado tiveram a percepção de que somente com o apoio activo e militante da Europa Ocidental, já fortemente capitalista, poderia favorecer o avanço do poder socialista na Rússia, que estava numa fase de desenvolvimento económico e social muito inferior.

Em 1919, nasce a III Internacional, cujo objectivo primeiro era o de desenvolver a formação de Partidos Comunistas, que pudessem orientar algum fermento revolucionário que estava a surgir na Europa, com o final da guerra mundial (1918).

A Revolução Alemã de 1918 e 1919, que conduziu ao derrube do imperador alemão (kaiser) e a instituição de uma República democrática, foi resultado de uma radicalização em sectores importantes das classes trabalhadoras do país, sob a orientação da Liga Spartaquista (que deu origem, mais ao Partido Comunista Alemão).

Esta Revolução foi motivada pela profunda crise económica, social e política que a Alemanha ficou com a guerra de conquista empreendida com a I Grande Guerra e influenciada, ideologicamente, pela Revolução soviética de 1917. A Alemanha começou a ser governada pelo Partido Social-Democrata, que se afastara dos ideais de Marx e Engels, nos finais dos anos 90 do século XIX, e, já posteriormente, deram o seu assentimento, antes da I Grande Guerra, à militarização do país.
Esta situação levou a uma ruptura interna, que incluiu alguns dos seus deputados, e veio a dar origem à Liga Spartaquista.

No seguimento da Revolução que afastou o Kaiser, os spartaquistas, que tinham como dirigentes principais Rosa Luxemburgo e Karl Liebknechet, ascenderam, mesmo ao poder, no Estado da Baviera, no sul da Alemanha, onde instituíram uma República Socialista, baseada na democracia dos conselhos operários.

Aboliram os latifúndios privados e criaram a auto-gestão nas fábricas e empresas. Iniciaram um movimento revolucionário, que ameaçava o Estado liberal, governado por sociais-democratas.

Estes, com apoio de milícias, muitas das quais já constituídas por radicais de direita, sufocaram, pela violência e pelo sangue, o novel Estado Socialista da Baviera e perseguiram, no país, os membros da Liga Spartaquista, assassinando Luxemburgo e Liebknechet.

Todavia, na Europa, verificava-se, em particular a partir da segunda década do século XX, que o despertar revolucionário dos sectores assalariados estava a decrescer e, começava a germinar, de maneira evidente, entre o campesinato e pequena burguesia, e inclusive, em franjas significativas do operariado, uma adesão de cariz contrário, propenso ao incremento de grupos e partidos reaccionários radicais.

Esta reacção permitiu a ascensão ao poder de Partidos fascistas e nazi, que, por vezes, com uma linguagem “socialista” e “nacionalista anti-capitalista”, veio a solidificar o domínio total, repressivo e, mesmo terrorista, da grande burguesia.

Na Europa e América do Sul, através de partidos com aquela designação ou próxima, e nos Estados Unidos, que, através de magnates destacados da banca e da indústria financiaram o partido nazi na Alemanha, e, internamente, com uma dominação absoluta do poder em torno dos dois agrupamentos partidários que constituem o cerne político da mesma dominação: O Republicano e o Democrata. E uma repressão feroz e selectiva a todos os que se opunham a esse poder, em especial os comunistas e socialistas, que tinham uma grande presença no movimento sindical e cultural do país e que, praticamente, desapareceram da cena política.

Na Rússia Soviética, principalmente, na fase mais aguda da guerra civil, o governo revolucionário tomou medidas (confisco forçado de produtos do campo, sem contrapartidas, entre outras) que, em lugar de dar ao campesinato pobre – e mesmo remediado – uma situação económica mais benéfica que se traduzisse em melhores condições de vida, afastaram – ou melhor dizendo, as tornaram passivas - essas massas populares do apoio à Revolução.

O governo soviético, por proposta de Lénin, tentou inverter via, instituiu em 1921, em NEP (Nova Política Económica), que reintroduzia a privatização da pequena propriedade: camponesa, comercial e industrial, liberalizava a política salarial e permitia a entrada de capital capitalista estrangeiro na economia do país.

Lénin apelidou esta nova formação económica de capitalismo de Estado. Foi uma via que nunca mais teve retrocesso. Aprofundou-se, posteriormente, em 1928, com a colectivização forçada já sob a liderança de José Stáline.

A Revolução socialista de 1917, à medida que os anos seguiam, não conseguia manter a via revolucionária. A Rússia soviética reformulara o antigo poder, mas apenas no seu início.

Estava “enlameada” nas contradições devido ao fraco desenvolvimento económico e social anterior.

Lutava, além do mais, contra uma burguesia capitalista europeia e norte-americana, que se fortalecia novamente, a partir dos anos 20, através de métodos terroristas é certo, mas que era mais potente, que produzia a transformações tecnológicas e científicas em “arma” de progresso.

Não conseguiu dar aos movimentos revolucionários do Ocidente capitalista o incremento capaz de impulsionar a maturidade política entre as massas populares que vacilavam.

Do ponto de vista da economia política, ao longo destes 93 anos, após 1917, o que podemos constatar, até porque se deram, no século XX, Revoluções de grande envergadura ou levantamentos revolucionários – como a chinesa de 1949, a cubana de 1959 e o Maio de 1968 em França, que fracassaram também – é que a evolução do incremento não esteve capaz, até agora, de levar à destruição da produção capitalista.

Embora o desenvolvimento contínuo dessas revoluções sociais, que se prolongam, agora já pelo século XXI, trouxe clarificações evidentes que apontam que a evolução da burguesia está a chegar a uma encruzilhada, cujos indícios de uma nova consciência social de ruptura se está a aproximar.

O caminho de uma nova sociedade está a ser percorrido, agora com uma clareza maior. E essa via é-nos dada pela nova revolução tecnológica que está a impor-se de forma total no Mundo que tem os germes revolucionários de uma nova economia e de um novo tipo de poder.

A fase de paz interna no seio do capitalismo internacional parece estar a chegar ao fim. Os arautos desse capitalismo sentem o chão escorregadio. Estão a engendrar crises atrás de crises, elevando a potências inacreditáveis de propaganda o medo da insegurança. Estão a armar-se despudoradamente contra o inimigo que clamam ser de modo abstracto e vago de terrorismo. Empurram Exércitos imperiais, como baratas tontas, para várias partes do Mundo, pensando que garantem, indefinidamente, a sustentação da sua ordem. Ameaçam até com novas guerras, até nucleares.

Mas, a subversão está, na realidade, a tornar-se o seu fantasma, cada vez mais real.

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